É com muita alegria que o Blog da Província de Santa Maria partilha a matéria publicada no Jornal "A Razão" na edição datada 3 e 4 de fevereiro a qual apresenta uma entrevista com a Ir. Alice Maria (Gema Pelizzaro), Irmã ICM, a respeito de sua dedicação, por muitos anos, na maternidade da Casa de Saúde. A matéria foi elaborada pela jornalista Ceura Fernandes. Confira a matéria:
A PARTEIRA QUE DEIXOU SAUDADES
Embora o Brasil tenha um dos mais altos índices de partos por operação cesárea, ainda se ouve a expressão “mais conhecida que parteira de campanha”. Isso dá ideia do quão popular e fundamental eram os préstimos dessas figuras há apenas algumas décadas passadas, quando obstetras e anticoncepcionais eram escassos, as famílias eram numerosas, e as mulheres ganhavam seus filhos, muitas vezes em casa, sem dia nem hora marcada. De ultrassonografia nem se falava. Ficava-se sabendo da posição do feto e do sexo das crianças, quando elas, naturalmente, nasciam de parto natural. Ou, quando, pela falta de atendimento adequado, os bebês sozinhos, ou junto com suas mães, os chamados ‘anjinhos’ morriam ao nascer. Nessas condições, um parto era cheio de mistérios, surpresas e medos, e o conhecimento adquirido pela prática por algumas mulheres, chamadas parteiras, era valioso.
Embora trabalhasse num hospital de cidade, tivesse o diploma de Enfermeira Obstetra pela Faculdade Paulista de Medicina, Gema Pelizzaro, nascida em São João do Polêsine, ou Irmã Alice Maria, como passou a ser chamada depois de fazer os votos religiosos, tornou-se mais conhecida que as próprias parteiras de campanha.
Entre as décadas de 60 e 80, no auge da Maternidade da Casa de Saúde, então da Cooperativa dos ferroviários, quando cesáreas eram raras, chegando a hora de terem seus filhos, algumas gestantes daquela época, mesmo quando já havia médicos especialistas, preferiam Irmã Alice pra lhes ajudar. Inclusive esposas de médicos confiavam na expertise de suas mãos. Modesta, mas sem esconder a alegria, ela contrapõe: “mas não era bem assim…”.
A verdade é que, durante os 20 anos que lá permaneceu, a sua habilidade se espalhou pela região. “Às vezes chegava a ter 15 partos num dia”, diz ela, lembrando que vieram ao mundo, e tiveram o primeiro choro nos seus braços, todo tipo de crianças, inclusive muitos nomes conhecidos e importantes. E que hoje, já com seus 40, 50 anos, estressados e sem muito tempo pra pensar nisso, não lembram, ou não sabem, exatamente como, onde e com quem nasceram. Mas seus umbigos, que precisavam ser cortados, e as cabecinhas amassadas, pela dificuldade do percurso até a luz, ainda estão lá, vivos na memória dela.
Hoje, aos 84 anos, ativa, como pode e no que pode, ela conta histórias que provoca saudade até mesmo em quem não viveu aquele tempo. Um tempo de poucos médicos e muita dedicação. Um tempo em que freiras, vestindo seus hábitos brancos, atendiam doentes ou parturientes e, inclusive, bordavam lençóis pra enfeitar seus leitos, num trabalho que era mais por missão e caridade do que por negócio e comércio. Um tempo em que só a sua congregação, a das Irmãs do Imaculado Coração de Maria, tinha a responsabilidade da gestão de mais de 20 hospitais, geralmente bem ajeitadinhos para bem acolher os doentes que chegavam.
Voltemos a esse tempo, ouvindo as histórias de Irmã Alice, uma das mais famosas parteiras que Santa Maria conheceu.
– Primeiro, vamos esclarecer a história do seu nome: Gema ou Alice? Meu nome de religiosa é Irmã Alice Maria Pelizzaro – mas o meu nome de batismo é Gema Pelizzaro. Naquela época, quando entrei na Congregação, quando se vestia o hábito e se fazia os votos, era trocado o nome da gente. Diziam assim, tudo será trocado, até o nome. Mas todos me conhecem por irmã Alice Maria, até meus irmãos, que nasceram depois que eu saí de casa, dizem: tu não és Gema, és Alice.
Tinha uma irmã minha que era deficiente, e quando entrei para o noviciado, falei com o pai se ele tinha algum nome que queria que me colocassem, pois tinha que trocar. E ele disse: “Se te dessem o nome de Alice, eu gostaria”. Colocaram meu nome de Alice Maria, porque já tinha uma Maria Alice.
– Como aprendeu a ser parteira, qual foi sua escola? Primeiro eu fiz o Curso de Enfermagem, curso superior, na Escola Paulista de Medicina. Foi lá pelo ano de 1962. E, com o tempo, a prática foi me ensinando.
– E depois do Curso de Enfermagem? Quando terminei o curso de enfermagem em São Paulo, a Congregação tinha começado a assumir hospitais. Até lá a Congregação não tinha hospital. Então, começou o trabalho. Assumi a Casa de Saúde de Santa Maria, que era da Cooperativa dos Ferroviários. Foi no início da década de 60, lá por 1964. Lá fiquei mais de 20 anos.
– Sempre atendendo partos? Na Casa de Saúde fiquei sempre na obstetrícia. Às vezes dava uma mão, ajudava um pouquinho na sala de cirurgia, no ambulatório, mas a minha principal função era na maternidade.
–Tem uma ideia de quantos partos fez nesses 20 anos, na Casa de Saúde? Não tenho bem certo. No início eu contava. Até que eram mil e tantos. Depois perdi a conta. Em vinte anos, fiz uns sete mil partos, talvez. Havia dias em que tinha até quinze partos, outros dias dois ou três, outro dia não tinha nenhum… Mas era uma média de muitos partos por mês.
– Lembra de alguns casos especiais de dificuldade, partos difíceis? Foram muitos os casos especiais. Naquela época a Universidade ainda não tinha muitos médicos formados. Era o tempo do Dr. Ronald Bossemeyer, aquela turma. Tinha poucos médicos em Santa Maria. Era o Dr. Celso Teixeira e o Dr. Caio Lemos que trabalhavam lá na Casa de Saúde. Logo depois que a turma se formou, no início da década de 60, alguns começaram a trabalhar lá. Faziam plantões, um dia cada um. Aí melhorou muito. Mas antes disso, a gente passava muito trabalho. Tinha casos difíceis, a posição da criança não estava certa, o pélvico, ou transverso, ou com procedência de um membro. E quantas vezes fiz extração a vácuo. Porque, muitas vezes, eu era a parteira que estava ali, com duas vidas – a mãe e a criança –, a mãe não tinha mais contrações, o médico não vinha, aí a gente tinha que agir. Atendíamos a família ferroviária, uma classe pobre, e a gente tinha que agir. Até fazíamos coisas que não era da nossa alçada, que não tínhamos aprendido na escola, mas não podíamos deixar a mãe morrer.
– Tinha que ser feita alguma coisa… Tinha que resolver.
– Ficou alguma lembrança especial de pessoas que a senhora ajudou a nascer? Muitos. Por exemplo, o de um sobrinho. Tinha uma cunhada que morava em Uruguaiana, gorda, já com certa idade, teve um filho lá. Fizeram cesárea e ela ainda perdeu a criança. Um belo dia ela aparece, tinha me avisado que ela vinha ganhar o nenê em Santa Maria, comigo. Aparece lá e, numa bela hora, entra em trabalho de parto. Ela ia ganhar normal, porque eles queriam mais filhos. Não é como hoje que fazem tudo para não ter filhos. Eles queriam mais filhos e eu fiz o que pude. Telefonei para o médico, lembro que naquele tempo era o Dr. Celso, e ele não vinha, estava ocupado com outro paciente, então coloquei o soro, até que acelerou o parto e a criança nasceu. Mas o nenê, meu sobrinho, mal, mal respirava. Ressuscitei-o respirando boca a boca. Só com oxigênio ele não reagia. Tinha que entrar ar, insuflar no pulmão dele. E fui tentando, até que conseguimos… Mas ele ficou todo dia meio mal. E o pai, a mãe – minha cunhada e meu irmão – se perguntavam, “será que vai ficar com alguma coisa do parto?” Eu tinha receio que ele ficasse com sequelas mentais, porque nasceu asfixiado. Lembro que esse foi um parto duplamente difícil e demorado.
Eu fiz de tudo um pouco: fisio, anestesiava o períneo e depois fazia sutura. Fiz de tudo, não lembro se cheguei a colocar vácuo. Só sei que nasceu muito mal. Ficou uns dias no oxigênio e hoje não tem nada. A minha cunhada ficou tão faceira que depois disso ganhou outros com parto normal. Hoje ele está casado com uma juíza, lá em Uruguaiana, e sempre que me vê, diz: “A senhora é minha segunda mãe, porque não me deixou morrer”. Hoje, está perfeito, não tem nada, e é o mais ajuizado da família.
– Conta-se que algumas mulheres preferiam ter o parto com a senhora do que com os próprios médicos. É verdade, queriam. Muitas vezes elas me chamavam à noite, fora de hora.
– Elas confiavam mais na senhora do que nos médicos?
Não sei, diziam que era por aí. Algumas famílias tiveram vários filhos comigo. Naquela época, quando comecei a trabalhar, as coisas eram mais difíceis, não havia muitos recursos como hoje. Depois eu saí de lá da Casa de Saúde, lá por 1986, 87. Eu comecei a sair aos poucos. Comecei a assumir uma obstetrícia em Frederico Westphalen e Jaguari. Então, eu saia um pouco e voltava para não dar um baque muito grande no atendimento, porque eles não queriam que eu saísse.
– O Brasil é hoje um dos países com grande percentual de partos por cesárea. Em alguns lugares chega a 80%. Como a senhora vê o abandono do parto natural, mesmo em situações de normalidade? É muito comércio. Outra coisa é o medo do sofrimento, da dor. E também, hoje as mulheres têm menos filhos. Querem ficar intactas. Quando o nenê nasce sempre pode ter um prolapso de bexiga, mas não querem ponto lá na vagina, no períneo. Então, é comodismo. Os pobres ainda ganham de parto normal, mas eles também já gritam que querem cesáreas. Tivemos uma aqui que entrou em trabalho de parto, e dizia: “eu quero fazer cesárea”. Já tinha ganhado outros filhos normalmente.
– E, para a criança, o que é melhor, nascer de forma cronológica e biologicamente natural, na hora estabelecida pelo médico e pela mãe, por cesárea? Se as coisas estão correndo bem, sempre o melhor é o parto natural. Porque no mesmo trajeto, durante o trabalho de parto, a criança vai amadurecendo, se completa. Tudo tem sua hora certa. Quando eu ainda estava trabalhando, quantas crianças eu vi, que faziam cesárea uns dias antes, porque a mãe tinha medo de entrar em trabalho de parto, tinha medo da dor, do sofrimento. Então, faziam cesárea antes. E o nenê nascia não bem maduro, gemendo, meio cianótico, roxinho, e tinha que ficar uns dias no oxigênio. E não se sabe das consequências, no futuro. Sempre digo que a fruta boa é a madura, ela cai na hora certa, quando está madura. O mesmo se dá com o nascimento, a criança tem que ter seu momento em que está completa para nascer.
– Lembra-se de alguns conhecidos, cujos filhos nasceram com a senhora? Muitos. Por exemplo, a Lucia Kümmel, esposa do Waldemar Kümmel, ganhava os nenês comigo. Também lembro da esposa do Dr. Flávio Bissacotti. Ele é ortopedista, e uma vez eu caí, quebrei umas costelas, e ele me atendeu no Hospital de Caridade e disse: “o que está fazendo aqui? Veio pegar alguma criança ainda por aqui? A senhora pegou as minhas”, disse ele, brincando.
– Quem mais a senhora ajudou a chegar ao mundo? Também os filhos do Osmar Santos, da Ana Maria Kliemann. Lembro da Iria Marim, ela ganhou nove crianças comigo. Eles vinham me chamar fora de hora, de noite, quando entrava em trabalho de parto. Mas ela sempre ganhava muito bem. Lembro que ela teve uma menina e os outros todos foram meninos. Eles queriam muito mais uma menina, mas vinha só menino.
Fiz nascerem muitos conhecidos, mas, agora me lembrar dos nomes… Lembro-me dos Cielo, dos Biacchi. Tinha também muitos de fora, de longe, que vinham para a Casa de Saúde, que tinha uma boa fama.
– Por causa da sua dedicação, da sua experiência? Não sei… Não se pode atribuir tanto a mim assim… Eu me dedicava, claro. Quantas vezes, noite, dia… Naquela época, os funcionários eram da Cooperativa e, algumas vezes faziam greve, e eu ficava sozinha atendendo, às vezes dois partos ao mesmo tempo. Outras vezes morria alguém da família do funcionário e como diversos eram da mesma família, muitos faltavam, então eu tinha que me virar e atender.
– Quais médicos trabalharam com a senhora na Casa de Saúde? Trabalhei muito com o Dr. Ronald, Dr. Clandio, Dr. Artêmio Celestino Alves. Gostava dele porque era um homem sério, ele não brincava. E outros, como o Dr. Chagas, Dr. Sitiá, Dr. Leonir, Dr. Wilson, Dr. Frederico, a Dra. Mirta – senti muito quando ela faleceu, era muito minha amiga, até me convidava para ir a casa dela.
– Depois de ter trabalhado tantos anos lá, a senhora tem acompanhado a trajetória da Casa de Saúde? Sim, acompanhei. Logo no começo, fui muitas vezes lá. Uma vez me deram uma plaquinha, ganhei uma plaquinha, em homenagem ao Dia da Enfermagem. Deve estar lá esta placa. De vez em quando eu ia lá.
Acompanhei e sofri muito com a decadência da Casa de Saúde. Tenho um amor àquela Casa, especialmente da maternidade que era. Eu bordava lençol, bordava a roupinha dos berços, os lençoizinhos, pra ter tudo bonito. Gostava de ver as mães que vinham lá e admiravam as coisas bonitas e em ordem. Depois, de vez em quando ia lá. Quando fechou por um tempo, eu sofri. Senti muito quando terminou o contrato com a nossa Congregação. Nós tínhamos muitos hospitais que não dava mais pra atender. Mas eu senti muito. Agora, graças a Deus, recomeçou, são as Irmãs Franciscanas, da Unifra, que estão lá.
– E o motivo por que a senhora deixou de atender lá.
Saí de lá e fui para Frederico Westphalen. Fui eleita para o Conselho de Saúde da Província. E tinha que viajar muito. Então, não dava pra eu ficar o dia inteiro trabalhando, porque tinha que andar visitando os outros hospitais da congregação.
– Houve uma época em que a sua congregação (do Imaculado Coração de Maria) chegou a ter a gestão de 24 hospitais? Tinha. No momento só temos dois, o de Gravataí e o de Gramado. Os outros não conseguiam se sustentar. A Congregação tinha que sustentar, porque o que o SUS pagava não dava . Então, a Congregação era que tinha que bancar. Acompanhei bem o hospital de Jaguari, que fechou não faz muito, São João do Polêsine, Taquari, Viamão. Teve também São Borja, Santo Augusto, e outros nas outras Províncias. Conheço mais a situação da Província de Santa Maria. Mas tínhamos hospitais grandes, como Viamão. E ainda agora tem Gravataí… Tentamos, lutamos, mas…
– Há quanto tempo a senhora está e o que faz em Vale Vêneto? Estou aqui há uns quinze anos. Faço um pouco de pastoral da saúde, visito pacientes, idosos que me chamam. Às vezes até vizinhos me chamam, durmo na casa de uma paciente idosa que está sozinha, que não tem ninguém. E ela é muito nervosa, então de vez em quando me chama às 2h da madrugada: “Irmã Alice, estou nervosa, estou sozinha, estou mal..” Aí pego a minha trocha, vou lá, olho a pressão dela, dou uma olhada se tem febre. Muitas vezes vou por aqui fazer soro para idosos, cancerosos na fase final, que não ficam mais no hospital, me chamam e eu vou. Não paro.
– Isso aos 84 anos… Também a vi, muito cedo, antes de o sol aparecer, andando pela horta… Faço um pouco de tudo, trabalho na infraestrutura. Porque quando vejo que as coisas não estão bem, falta varrer o corredor, por exemplo, cuidar do jardim, o que não está bem eu faço. Também acompanho um pouco os funcionários e cuido das capelas. Tenho oito a dez lugares para arrumar. Por exemplo, colocar uma flor pra Nossa Senhora, aqui na gruta, tem outra grutinha lá, mais outra lá… mais a Bárbara (Barbara Maix, fundadora da Congregação), que também coloco flores pra ela.
– Pelo jeito, desde que levanta a senhora não para. Faço de tudo um pouco. Tenho 84 anos, sou diabética e, à tarde, fico um pouco cansada. Mas, pela manhã, não paro. Também caminho todos os dias. Faço pelo menos meia hora de caminhada, que me faz bem, me mexo, me chacoalho, porque o diabético tem que se mexer. E cuido da alimentação, da medicação, tomo insulina.
Também trabalho com aquele projeto a Nota é Minha, pra ajudar o colégio daqui. Tem uns amigos de Santa Maria que me guardam as notas, então vou lá buscar. E, um dia estava no ônibus e uma senhora levantou os braços e disse “Oi, Irmã Alice, onde que a senhora anda, vem na minha casa…”. Mas não dá para ir a todos os lugares.
– A senhora havia feito o seu parto? Sim, tinha feito o parto dela. Agora lembrei também que fiz diversos partos da família do Benhur Pelissari, aquele que trabalha com aparelhos de ouvido. Aquele rapaz que trabalha lá fui eu que botei no mundo.
– E que conselho de saúde dá pras pessoas que tem essa vida agitada, corrida de hoje? Eu teria muito conselho pra dar. Em primeiro lugar, cuidar da alimentação, que é a base. E fazer exercícios. Nem precisa ser todos os dias. Eu caminho todos os dias porque sou diabética. Uma vez eu caminhava uma hora, agora caminho só meia. Também leio muito. Leio jornal, A Razão é meu preferido, leio diariamente. Durante o ano, quando tem aula aqui no colégio, o jornal chega de manhã, senão chega ao meio dia, com o ônibus. Sempre li A Razão.
– O que mais tem pra contar de sua vida? Quando a Congregação me pediu pra fazer Enfermagem, eu não queria, porque eu estava estudando música. Estava em Vale Vêneto. Entrei na Congregação aqui nesta casa, eu era juvenista, e a gente aprendia gaita, piano… E depois eu já estava bem alfabetizada na música, me pediram para ajudar a alfabetizar crianças. Eu estava bem adaptada, aí a Congregação me mandou fazer o ginásio, porque aqui não tinha – fiz o primário aqui e fui fazer o ginásio na Glória, em Porto Alegre. Então, voltei pra cá um ano, porque naquela época era costume. Acabado o ginásio, a aspirante ficava um ano trabalhando numa casa. Então, vim aqui e atendia uma sala de aula, uma classe. E tinha um aluno que era filho do Leonardo Hermes, que era dentista. Esse menino era meu aluno. E sabe como é a criançada…, me incomodei, dei um murro com a mão no quadro negro, pra eles ficarem quietos. Aí esse menino levantou e disse: “Professora, a sua mão parece uma raquete”. Sempre me lembro disso e tenho que rir.
– E as mãos, que pareciam raquetes, ficaram famosas por acariciar bebês nos tantos partos que fizeram. Lembra-se de ter morrido alguma criança em suas mãos? Criança, por causa do parto difícil, não. Agora, é claro, uma criança ou outra, deficiente, ou que já vinha em sofrimento. Mas que eu me sinta culpada, não, nunca. Acho que nenhuma. Tenho a consciência tranquila. Sempre procurei fazer o possível, dar o melhor de mim, para tudo correr bem.
Durante o tempo em que trabalhei na enfermagem, na obstetrícia, foi como uma missão. É uma vida que está ali por nascer, por vir ao mundo. Estávamos ali diante da vida e da responsabilidade que a gente tinha com a mãe e com a criança. Eu ficava sempre atenta, escutava os batimentos, fazia o que podia. Também não me lembro de nenhuma mãe que tenha morrido em minhas mãos e nem como consequência de um parto que eu tenha feito. Depois que os médicos começaram a se formar na Universidade, na década de 60, quando começaram a sair as turmas da Medicina, melhorou. Mas antes, quando eu chamava os médicos, às vezes não vinham, por que eram poucos, e eu tinha que me virar e atender sozinha.
O RECONHECIMENTO CARINHOSO
"Num determinado período, não havia em Santa Maria quem não tivesse ouvido falar na Irmã Alice. Ou crianças que, ao nascerem, não tivessem passado pelas mãos dela. Uma pessoa conhecida no Rio Grande do Sul por dedicar sua vida em favor da saúde. Ela representa aquilo que, a nível hospitalar, falta tanto para com o carinho a pacientes, para com o amor a profissão. Acima de tudo, para tantas crianças que nasceram com ela, e que ela vibrava como se fossem seus filhos". José Haidar Farret, vice-prefeito, Secretário de Saúde do Município. Como médico, conheceu o trabalho de Irmã Alice.
"Nasci, de sete meses, com 1,7kg, pelas mãos de Irmã Alice. Eu era tão pequeno que um médico disse pra minha mãe (Valquíria Mafioletti Beltrame) me levar pra morrer em casa. Mas ela voltava à Casa de Saúde pra que eu recebesse oxigênio pra exercitar meus pulmões, sob os cuidados de Irmã Alice. Isto foi em 1964. Hoje estou aqui, lembrando que minha mãe e minhas tias sempre falavam muito bem de Irmã Alice, da confiança que tinham nela, e que era uma pessoa maravilhosa. Meu irmão e meus primos também nasceram pelas mãos dela. Hoje, teria vontade de conhecê-la”. Valmir Beltrame, presidente do Conselho Municipal de Cultura que, por acaso, deu esse depoimento nos corredores da atual Casa de Saúde, a antiga Maternidade onde havia nascido.
"Irmã Alice foi, por muitos anos, responsável pela maternidade da Casa de Saúde. Ela fazia os partos, fazia um trabalho bem feito, foi uma pessoa excepcional. Eu operava lá e era amigo dela. Naquela época, era um belíssimo hospital. Meus dois filhos nasceram lá, com ela e o Dr. Ronald. A presença de religiosas, seja qual for religião, numa maternidade ou na administração de um hospital é sempre boa”. João Flávio Bissacoti, médico, cirurgião traumatologista.
Amada Irmã Alice!
Ir. Camila Dalmolin Hoffmann, ICM
Blog da Província de Santa Maria
Parabéns á Irmã Alice ! Parabéns á Congregação pelas Irmãs que tem.
ResponderExcluirSomos testemunha de tanta dedicação dopessoal na área da saúde, ficando 24hs atenta aos mínimos detalhes. Isto só pode ser fruto de um seguimento radical á JESUS CRISTO.Ir.Valquiria